Reforma Tributária: texto tem avanços pontuais, mas segue prejudicando o setor de Serviços, afirma FecomercioSP
Dispositivos de
transferência de crédito e de não cumulatividade causarão impactos negativos às
empresas; alíquota zero para produtos de higiene feminina e ajustes parciais no
‘split payment’ são positivos
O relatório apresentado pelo Grupo de Trabalho (GT) da
Câmara dos Deputados para regulamentação da Reforma Tributária traz avanços
pontuais, mas segue prejudicando as empresas enquadradas no Simples Nacional e,
sobretudo, o setor de Serviços. Na percepção da Federação do Comércio de
Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP), apesar de
algumas modificações positivas, pontos relevantes como a não cumulatividade
ampla e o tratamento diferenciado ao Simples Nacional ainda precisam ser
ajustados. Por outro lado, um pleito de relevância social defendido pela
Entidade foi atendido: a redução de 60% para alíquota zero a produtos de
cuidados básicos à saúde menstrual.
Na última semana, a FecomercioSP, por meio do Conselho de Assuntos Tributários
e do Conselho Superior de Direito, encaminhou, aos membros do GT, nove
propostas de ajustes. Dentre as sugestões, as principais propõem justamente
aprimoramentos do dispositivo que regula a não cumulatividade, que dispõe sobre
as alíquotas de IBS/CBS; da lista de alimentos da Cesta Básica Nacional de
Alimentos (CeNA); da transferência de crédito da empresa do Simples Nacional,
entre outras. Segundo a Entidade, se acatadas, elas podem aperfeiçoar a
legislação — da qual a FecomercioSP é crítica desde o início.
Quanto ao Simples Nacional, a proposta da Federação diz respeito
ao dispositivo que limita a transferência de crédito do novo IBS/CBS por
empresas optantes do regime, que, no cotidiano do País, são pequenas e médias
(PMEs). O texto não teve mudanças e, da maneira como está, limita essa
operação apenas a valores correspondentes a tributos “pagos”. É um contrassenso
tanto em relação ao que está na Constituição, que fala de tributos “cobrados”,
quanto ao sistema atual, que permite a transferência integral de crédito de
PIS/Cofins. A proposição da FecomercioSP, nesse aspecto, é que o projeto seja
alterado em plenário para permitir a transferência de crédito da CBS em um
porcentual equivalente à alíquota aplicável, além de manter a regra atual
sobre contribuições que serão extintas (PIS/Cofins).
Em resumo, a reforma segue causando perda de competitividade a
contribuintes que estiverem no meio da cadeia produtiva, já que o crédito
transferido será limitado ao tributo pago no regime único, bem inferior à
alíquota de referência. A Entidade salienta que esse ambiente de negócios
tem forte participação feminina, correspondendo a 53% das empresas de Serviços
enquadradas no Simples.
Cesta básica está desequilibrada
O trecho do relatório que dispõe sobre as alíquotas dos
itens que compõem a CeNA praticamente não teve grandes modificações — apenas o
óleo de babaçu, presente na alimentação da população das regiões Norte e
Nordeste, foi incluído. A proteína animal permanece fora da cesta, com a
redução de 60% da alíquota de referência. Na visão da FecomercioSP, sua
inclusão é relevante para garantir uma alimentação adequada, conforme determina
a Emenda Complementar 132.
Outro item essencial, o sal, também não integra a lista. Para a Entidade,
a relação de apenas 15 deveria ser ampliada para 19 itens, conforme consta
do art. 3º do PLP 35/2024 — projeto que contemplou as sugestões da sociedade
civil frutos dos debates promovidos pela coalizão das frentes parlamentares.
Além disso, um decreto recente editado pelo governo federal, (11.936, de 5 de
março de 2024), que trata das políticas públicas relacionadas à composição da
CeNA, elenca as carnes como item essencial para uma alimentação saudável. Ainda
assim, para fins tributários, a decisão do Legislativo, até o momento está
deixando de fora um alimento importante para a refeição diária do brasileiro.
Produtos de higiene feminina com
alíquota zero
Ainda assim, um pleito relevante da Federação foi atendido:
a redução de 60% para alíquota zero a produtos de cuidados básicos à saúde
menstrual. Em articulações no Congresso, a FecomercioSP destacou que se trata
de itens essenciais e caros que têm, juntamente com medicamentos, grande peso
no orçamento familiar, principalmente para as pessoas de baixa renda.
Outro avanço relevante foi no período de revisão das listas dos dispositivos
médicos, acessibilidade a Pessoas com Deficiência (PcD) e medicamentos, que têm
reduções de 60% e 100% da alíquota. O substitutivo reduziu o prazo para
inclusão de novos produtos na lista de 365 para 120 dias, permitidas ainda
novas inclusões, a qualquer tempo, em período de emergência de saúde pública.
‘Split payment’ tem ajuste parcial
As regras da não cumulatividade, embora sejam um dos pilares
da reforma, limitam o crédito aos valores efetivamente pagos, além de
estabelecer várias restrições. Para a FecomercioSP, é temerário construir um
sistema tributário baseado em uma sistemática complexa de recolhimento, como da
liquidação financeira da operação (o denominado split payment), sem
garantias de eficácia e desconhecimento dos custos de sua elaboração para o
Estado.
A ideia da Federação era que, ao menos, fosse incluído um dispositivo que
garantisse o crédito do tributo devido, caso a ferramenta não funcionasse
adequadamente. Nesse sentido, foi inserido um dispositivo que permite o
creditamento do valor informado no documento fiscal, dispensando a exigência do
pagamento do tributo, enquanto não implementado o split payment ou a
modalidade de recolhimento pelo adquirente. A alteração atende
parcialmente ao pleito da Entidade, que mantém a crítica quanto à restrição ao
crédito na hipótese de ser disponibilizado o pagamento pelo adquirente, por
entender que tal exigência pode resultar em aumento de obrigação acessória ao
contribuinte.
A sugestão às restrições de creditamento relativas a bens e serviços
relacionados aos empregados do contribuinte, como a despesa com plano de saúde,
não atende à preocupação da Entidade. Isso acontece porque, apesar de destacar
que a exclusão ao crédito não se aplica aos serviços de saúde disponibilizados
pela própria empresa para empregados, o texto restringe esse serviço prestado
durante a jornada de trabalho, ou seja, abrange apenaso médico que atua nas
dependências da empresa.
Prazos de devolução
Um aspecto positivo do texto substitutivo é referente ao
ressarcimento de tributos pagos. Os prazos para apreciação do pedido foram
reduzidos de 60 para 30 dias a contribuintes enquadrados em programas de conformidade,
além de mantido o prazo de 60 dias no caso de crédito de ativo imobilizado e
para operações compatíveis com o padrão de operações do contribuinte. Também
foi reduzido de 270 para 180 dias o prazo para análise nos demais casos, ou
seja, aqueles fora do padrão. Em todos as situações, após a apreciação do
pedido, o ressarcimento ocorrerá em até 15 dias.
As propostas da FecomercioSP ainda contêm sugestões sobre a transparência da
fixação da alíquota de referência — o governo fala em 26,5%, mas sem oferecer
as bases do cálculo utilizado —, sobre as regras do cashback para
famílias de baixa renda e aumento nos limites de faturamento das empresas
do Simples Nacional.
Agenda da FecomercioSP
Crítica da reforma desde o início, a Entidade participou ativamente
dos GTs criados pela coalizão das frentes parlamentares que apresentaram
projetos de regulamentação do texto aprovado.
Segundo a FecomercioSP, esse tema está longe de se esgotar. Embora a Reforma
Tributária esteja perto de ser regulamentada, há espaço para seguir discutindo
os efeitos perversos de um Estado que arrecada muito (32% do PIB), oferece
serviços ruins, burocratiza o ambiente de negócios e alimenta a desigualdade.
Não é de hoje que a Federação destaca que, em vez de prosseguir com uma
mudança na legislação que aumente impostos, o governo avançasse em medidas para
reduzir os próprios gastos. Esse deve ser o foco das futuras discussões
nacionais.
A Entidade entende ser o momento de avançar em discussões
estruturais rumo a uma Reforma Administrativa do Estado que
inclua a gestão da máquina pública, do quadro de salários dos servidores até o
fornecimento de serviços.
Sobre a FecomercioSP
Foto: Agência Brasil.