A complexa teia entre liberdade de expressão e fake news
Dr. João Ibaixe Jr. –
Professor Jonathan Hernandes Marcantonio
Em uma era definida pela informação instantânea e pela
interconectividade global, a liberdade de expressão enfrenta desafios sem
precedentes com a ascensão das fake news. Este fenômeno, caracterizado pela
disseminação deliberada de informações falsas ou enganosas, ameaça não apenas a
integridade do debate público, mas também os alicerces da democracia. A
liberdade de expressão, um direito fundamental consagrado em constituições e
tratados internacionais, promove a diversidade de opiniões e a participação
cidadã. No entanto, a proliferação de notícias falsas exige uma reflexão
jurídico-té cnica sobre os limites desse direito.
As fake news diferem de simples erros ou interpretações divergentes por sua
intenção de enganar, podendo minar a confiança nas instituições, polarizar
sociedades e incitar a violência. Diante desse cenário, emerge a questão: como
equilibrar a proteção à liberdade de expressão com a necessidade de combater a
desinformação?
A liberdade de expressão é amplamente reconhecida como um direito não
absoluto, sujeito a restrições destinadas a proteger outros direitos e
interesses públicos. A luta contra as fake news se insere nesse contexto,
justificando medidas que, embora limitem esse direito, são proporcionais e
necessárias para preservar a ordem democrática.
A regulação das fake news representa um desafio complexo. Medidas
excessivamente amplas ou imprecisas correm o risco de reprimir o debate
legítimo, enquanto a inação pode deixar o campo livre para a manipulação da
verdade. A resposta a esse dilema passa pela implementação de estratégias
jurídicas e regulatórias equilibradas.
Diversos países têm explorado legislações específicas para enfrentar o problema
das fake news. Na Alemanha, a Lei de Execução da Rede (NetzDG) exige que
plataformas de mídia social removam conteúdo ilegal, incluindo notícias falsas,
em um prazo específico sob pena de pesadas multas. Em Singapura, a Lei de
Proteção contra Falsidades e Manipulação Online (POFMA) permite que o governo
exija a correção ou remoção de informações consideradas falsas. Na França, a
lei sobre a manipulação da informação visa combater a disseminação de notícias
falsas durante períodos eleitor ais.
Além da legislação, a verificação de fatos por organizações independentes e a
autoregulação de plataformas digitais surgem como soluções complementares.
Estas estratégias promovem a responsabilidade e a transparência, permitindo que
a sociedade civil e as empresas de tecnologia desempenhem um papel ativo no
combate à desinformação, sem necessidade de intervenção estatal direta.
A educação midiática também se destaca como uma ferramenta vital, capacitando
os cidadãos a discernir entre informações confiáveis e falsas, fortalecendo
assim a resiliência da sociedade diante da desinformação.
Confrontar as fake news, portanto, requer uma abordagem multifacetada que
equilibre a proteção à liberdade de expressão com a promoção de um espaço público
informado e confiável. A legislação pode oferecer um caminho, mas a solução
definitiva reside na combinação de leis cuidadosamente elaboradas, práticas de
autoregulação responsáveis e um público bem informado e crítico.
João Ibaixe Jr. - É advogado
criminalista, ex-delegado de polícia, especialista em Direito Penal,
pós-graduado em Filosofia, Ciências Sociais e Teoria Psicanalítica e mestre em
Filosofia do Direito e do Estado.
Jonathan Hernandes Marcantonio -
Doutor em Filosofia do Direito e do Estado pela PUC-SP. Professor
Universitário. Advogado com ênfase em Direito Público. Ex-professor da USP
Ribeirão Preto.